Conta-se
que há muito tempo, lá para as bandas do Peloponeso, um homem extremamente
atormentado pela chacina de sua mulher e filhos, encontrou em 12 trabalhos uma
forma de purificar sua alma, uma espécie de segunda chance. Em seu segundo
trabalho, enquanto cortava e queimava as cabeças da Hidra de Lerna, teve como
empecilho um enorme carangueijo, que advindo das águas barrentas do pântano
local procurou distraí-lo. Com somente uma pisada, esmagou o carangueijo e deu
fim à toda sua bravura. Comovida, Hera, mulher de Zeus, viu no ato do
carangueijo um ato louvável e eternizou-o no céu como a constelação de câncer.
Ainda hoje, câncer torna-se um empecilho para muitos homens como Hércules;
porém, bem como Hércules contava com Jolau, esses homens, contam com o SUS como
ajudantes nessa batalha contra a Hydra de Lerna e o Câncer.
São
um total de 277 serviços que oferecem atendimento oncológico pelo SUS e já que
o serviço oncológico dispende de grandes gastos, integram a Atenção Terciária
ou de Alta Complexidade. Ao contrário do que acontece com Hércules, não
necessariamente câncer precisa nos pegar de surpresa, há uma série de condutas
que o médico deve tomar ao identificar o câncer que será mister em seu
tratamento. Em seu Manual e Ações de Controle e Combate ao Câncer, o INCA
(Instituto Nacional do Câncer) estabelece que o médico deve fazer o diagnóstico
de câncer por meio de história clínica, exame clínico e exames complementares,
que vão desde exames imagiológicos com ou sem visualização direta do local, até
os exames bioquímicos, como aqueles que buscam por marcadores de proteínas. Por
exemplo, em caso de o paciente com mais de 50 anos de idade, ir ao médico
relatando disfunção erétil, dificuldade ao urinar isso induzirá em um bom
médico uma suspeita de câncer de Próstata, o que levará ele a realizar o exame
físico, o toque retal, e ao verificar alterações na prostata (a textura da
prostata deve ser semelhante a da ponta do nariz), o médico deverá pedir um
exame laboratorial para a confirmação do diagnóstico como o PSA ( Antígeno
Prostático Específico), este em auxílio com biopsia do orgão poderá indicar a
gravidade do tumor. Vejamos o seguinte caso clínico:
Paulo
Lira Cardoso, 50 anos, lavrador e procedente da Zona Rural do Piauí,
encaminhou-se direto para uma UPA (Unidade de Pronto-Atendimento), integrante
da Média Complexidade do SUS, relatou dificuldade de ingerir alimentos, pois “a
língua não ajuda”, notou um aumento na salivação e um leve emagrecimento nos
últimos meses. Há dois meses, ao se barbear notou um nódulo cervical indolor no
lado direito. Não possui antecedentes pessoais e familiares relevantes para o
caso, mas em seus hábitos de vida vale ressaltar que é tabagista desde os 15
anos e etilista desde os 20, ingerindo meio litro de cachaça diariamente – Esse
foi o colhimento de histórico do paciente, agora vamos para o segundo passo, o
exame físico – Pressão arterial, temperatura corporal, frequência cardíaca
normais, rinoscopia, otoscopia e laringoscopia normais, os membros
encontravam-se sem edemas, era possível palpar-se os linfonodos inguinais, e um
linfonodo submandibular com consistência endurecida, na boca havia uma lesão que
media aproximadamente 3cm. Então foi-se pedido os exames complementares para
chegar-se à conduta de tratamento – o terceiro passo – foi pedido o hemograma
completo, que encontrava-se alterado e com indicativo de anemia, a glicemia,
que encontrava-se normal, o proteinograma, que encontrava-se com indicativo de
Hipoproteinemia, todos exames de média complexidade e realizados no próprio
local em que Paulo foi atendido. Provavelmente, a anemia e a hipoproteinemia
eram consequências da carência nos hábitos alimentares. Ao verificar-se o tumor
por meio do exame histopatológico, Paulo foi encaminhado ao serviço de Alta
complexidade, onde retirou a metade direita da língua. O paciente ainda
permanecerá em acompanhamento, realizando exames, como o indicador de
marcadores de tumor celular, para verificar se foi feita ou não a erradicação
completa do câncer. Certamente, também contará com o auxílio de um
fonaudiólogo, um fisioterapeuta e um psicólogo, tudo pelo SUS.
No próximo post, finalizaremos
nossas postagens sobre câncer finalizando a história de Hércules e falando um
pouco da infraestrutura necessária para o tratamento contra o câncer, da
logística envolvida e mais casos clínicos.