sábado, 12 de julho de 2014

Câncer, Hércules, câncer de boca

                Conta-se que há muito tempo, lá para as bandas do Peloponeso, um homem extremamente atormentado pela chacina de sua mulher e filhos, encontrou em 12 trabalhos uma forma de purificar sua alma, uma espécie de segunda chance. Em seu segundo trabalho, enquanto cortava e queimava as cabeças da Hidra de Lerna, teve como empecilho um enorme carangueijo, que advindo das águas barrentas do pântano local procurou distraí-lo. Com somente uma pisada, esmagou o carangueijo e deu fim à toda sua bravura. Comovida, Hera, mulher de Zeus, viu no ato do carangueijo um ato louvável e eternizou-o no céu como a constelação de câncer. Ainda hoje, câncer torna-se um empecilho para muitos homens como Hércules; porém, bem como Hércules contava com Jolau, esses homens, contam com o SUS como ajudantes nessa batalha contra a Hydra de Lerna e o Câncer.

                São um total de 277 serviços que oferecem atendimento oncológico pelo SUS e já que o serviço oncológico dispende de grandes gastos, integram a Atenção Terciária ou de Alta Complexidade. Ao contrário do que acontece com Hércules, não necessariamente câncer precisa nos pegar de surpresa, há uma série de condutas que o médico deve tomar ao identificar o câncer que será mister em seu tratamento. Em seu Manual e Ações de Controle e Combate ao Câncer, o INCA (Instituto Nacional do Câncer) estabelece que o médico deve fazer o diagnóstico de câncer por meio de história clínica, exame clínico e exames complementares, que vão desde exames imagiológicos com ou sem visualização direta do local, até os exames bioquímicos, como aqueles que buscam por marcadores de proteínas. Por exemplo, em caso de o paciente com mais de 50 anos de idade, ir ao médico relatando disfunção erétil, dificuldade ao urinar isso induzirá em um bom médico uma suspeita de câncer de Próstata, o que levará ele a realizar o exame físico, o toque retal, e ao verificar alterações na prostata (a textura da prostata deve ser semelhante a da ponta do nariz), o médico deverá pedir um exame laboratorial para a confirmação do diagnóstico como o PSA ( Antígeno Prostático Específico), este em auxílio com biopsia do orgão poderá indicar a gravidade do tumor. Vejamos o seguinte caso clínico:
                Paulo Lira Cardoso, 50 anos, lavrador e procedente da Zona Rural do Piauí, encaminhou-se direto para uma UPA (Unidade de Pronto-Atendimento), integrante da Média Complexidade do SUS, relatou dificuldade de ingerir alimentos, pois “a língua não ajuda”, notou um aumento na salivação e um leve emagrecimento nos últimos meses. Há dois meses, ao se barbear notou um nódulo cervical indolor no lado direito. Não possui antecedentes pessoais e familiares relevantes para o caso, mas em seus hábitos de vida vale ressaltar que é tabagista desde os 15 anos e etilista desde os 20, ingerindo meio litro de cachaça diariamente – Esse foi o colhimento de histórico do paciente, agora vamos para o segundo passo, o exame físico – Pressão arterial, temperatura corporal, frequência cardíaca normais, rinoscopia, otoscopia e laringoscopia normais, os membros encontravam-se sem edemas, era possível palpar-se os linfonodos inguinais, e um linfonodo submandibular com consistência endurecida, na boca havia uma lesão que media aproximadamente 3cm. Então foi-se pedido os exames complementares para chegar-se à conduta de tratamento – o terceiro passo – foi pedido o hemograma completo, que encontrava-se alterado e com indicativo de anemia, a glicemia, que encontrava-se normal, o proteinograma, que encontrava-se com indicativo de Hipoproteinemia, todos exames de média complexidade e realizados no próprio local em que Paulo foi atendido. Provavelmente, a anemia e a hipoproteinemia eram consequências da carência nos hábitos alimentares. Ao verificar-se o tumor por meio do exame histopatológico, Paulo foi encaminhado ao serviço de Alta complexidade, onde retirou a metade direita da língua. O paciente ainda permanecerá em acompanhamento, realizando exames, como o indicador de marcadores de tumor celular, para verificar se foi feita ou não a erradicação completa do câncer. Certamente, também contará com o auxílio de um fonaudiólogo, um fisioterapeuta e um psicólogo, tudo pelo SUS.

                                No próximo post, finalizaremos nossas postagens sobre câncer finalizando a história de Hércules e falando um pouco da infraestrutura necessária para o tratamento contra o câncer, da logística envolvida e mais casos clínicos.