domingo, 20 de julho de 2014

Hidra de Lerna, CACON, UNACON

                Hércules adentrava velozmente os pântanos de Lerna, como se, após passar o pântano, fosse chegar aos campos elísios, lá Megara e seus dois filhos lhe aguardariam. O peso da pelagem do leão de Neméia, quase que dobrado pelo lamaçal, não era nada perto do peso do sangue filicída em suas mãos. A umidade gelava-lhe os ossos e tornava-se suportável apenas porque já havia experimentado a frieza do desprezo de Hera.

Ali estava ela, retorcida sobre si mesma tantas vezes que mais parecia uma orgia de serpentes, suas cabeças emergiam em meio às escamas, famintas, sedentas. Hércules avançou com ferocidade, a cada cabeça cortada, duas nasciam no lugar. Como um câncer, as cabeças da hidra se mutiplicavam e o segundo trabalho de hércules tornava-se mais árduo. Engenhosamente, Hércules estancou o corte das cabeças da hidra com um toco ardente e a oitava cabeça, dita imortal, Hércules encerrou para sempre debaixo de uma pedra.
Do mesmo jeito que Hércules prevaleceu sobre a fera de Lerna, o SUS vem prevalecendo sobre o câncer. Costumamos a dizer nas converas de mesa de bar, que o sistema de saúde brasileiro implode sobre si mesmo, não funciona e que está fadado ao fracasso. Claro que essas acusações vem  da nossa indignação com a política, com o sistema ou com a lógica social do Estado brasileiro. Porém, quem emite esse tipo de opinião sobre o SUS desconhece ou desconsidera seu serviço de Atendimento Oncológico. Pertencente à Atenção Especializada de Alta Complexidade, esse atendimento custou aos cofres públicos um gasto de R$ 2,4 bilhões de reais só em 2012, isso sem contar o investimento advindo do capital privado que possui parceria com a rede pública nos grandes centros de tratamento para o câncer.
O câncer não é uma doença, mas um conjunto de doenças que partilham da mesma origem: um conjunto de células que se mutiplicam perigosamente como as cabeças da Hidra de Lerna, e que podem acometer orgãos diferentes, provindo disso a sua variedade de sintomas. Por essa inespecificidade, o câncer exige atenção específica.
 Como o paciente como suspeita de câncer procederia dentro do Sistema Único? Primeiramente, ao ter uma suspeita de câncer, ele deve se dirigir à Rede Básica, lá serão feitos os primeiros testes. O médico, atuando como generalista, fará a anamnese do paciente e pedirá exames complementares e encaminhará o paciente para um CACON ou para um UNACON com seu histórico e exames feitos que confirmam a suspeita anexados. CACONs (Centros de Referência de Alta Complexidade Oncológica) e UNACONs (Unidades de Atendimento de Alta Complexidade Oncológica), que diferem apenas quanto a presença obrigatória de unidades radioterápicas (os UNACONs não são obrigados a possuir os CACONs sim), recebem o paciente e confirmam a suspeita do médico da unidade básica ou aprofundam o diagnóstico dele com exames imagiológicos mais avançado e com exames imunohistoquímicos, e é nesse ponto que reside uma das fragilidades do Atendimento Oncológico da Rede Pública: quase 80% dos especialistas reclamam da demora excessiva desses exames.
Após a realização de um diagnóstico aprofundado de câncer, a mágica do Atendimento Oncológico do SUS acontece. Aqui, o financiamento do tratamento não tem foco no remédio, mas sim no paciente. Como isso ocorre? Bem, a conduta utilizada para o tratamento no SUS não é exposta de maneira geral em sua gênese jurídica, mas é destrinchada em diversas portarias emitidas pelo Ministério da Saúde que dissertam sobre as categorias específicas de câncer. Contudo, podemos dizer que essas portarias abordarão o tratamento sob uma ótica geral, pois o tratamento para câncer é específico para o paciente e requerido pelo médico que o atendeu e o acompanhou, assim é levado em consideração localização, grau de extensão e tipo celular do tumor, por isso dizemos que o assunto deixa de ser o remédio, para ser o paciente.
Por último, o paciente é encaminhado para esmagar seu câncer debaixo de uma pedra. Os CACONs e os UNACONs oferecerão atendimento especializado e de alta complexidade, com clínicos, cirurgiões, UTIs e atendimento psicológico. Além disso, nesses centros o paciente poderá realizar sua quimioterapia ou radioterapia, dependendo da necessidade. Essas terapia ainda podem ser realizados nos QTs e RTs, serviços localizados de quimioterapia e radioterapia, respectivamente.

Hoje, estima-se que o câncer pode ser curado em 60% dos casos, contudo o espectro de dores insuportáveis, mutilação, dor e morte, ainda continua assombrando. A principal chance cura reside na prevenção e na detecção precoce, dessas boa parte pode ser feita por exames meramente físicos ou por exames laboratorias como a contagem de proteínas marcadoras, um importante aliado.

6 comentários:

  1. Muito interessante a importância e a eficiência dos CACONS e dos UNACONS no tratamento. No entanto, o sistema público peca gravemente ao não oferecer aparelhagem avançada, disponível e rápida para o diagnóstico. Exames imagiológicos e histopatológicos, em alguns casos, requerem uma fila de espera de meses. E tal demora é fator agravante para não descoberta de cânceres precoces, que possuem as melhores chances de cura.

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  2. Existem 276 hospitais habilitados no tratamento do câncer. Todos os estados brasileiros têm pelo menos um hospital habilitado em oncologia, onde o paciente de câncer encontrará desde um exame até cirurgias mais complexas. A habilitação das Unacons e Cacons é periodicamente atualizada de acordo com a necessidade e indicação dos estados, baseadas em padrões e parâmetros publicados na Portaria n° 140, de 27 de fevereiro de 2014. Cabe às secretarias estaduais e municipais de saúde organizar o fluxo de atendimento dos pacientes na rede assistencial, estabelecendo a referência dos pacientes para Unacon ou Cacon.
    (http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/db8cb580434fe415a837fc1fd89ecfca/Portaria+140+fev+2014.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=db8cb580434fe415a837fc1fd89ecfca)

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  3. Como bem sabemos, a Constituição de 1988 determinou ser dever do Estado garantir saúde a toda a população e, para tanto, criou o SUS (Sistema Único de Saúde), que se configura como uma complexa rede de atendimento em que estados e municípios, orientados por um fragilíssimo sistema de regulação, devem garantir atendimento de qualidade aos 190 milhões de brasileiros, dos quais 140 milhões dependem exclusivamente da saúde pública. Nesse contexto, milhares de pacientes com câncer enfrentam verdadeiras batalhas para conseguir o tratamento. Tratamento que lhes é de direito. A odisseia, muitas vezes, começa ainda nas unidades básicas de saúde, as ‘portas de entrada' do sistema, com as dificuldades para conseguir consultas primeiramente com generalistas e, depois, com especialistas e seus respectivos encaminhamentos para exames.

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  4. Os chamados CACON (UNACON), são siglas dadas pelo Ministério da Saúde para clínicas particulares que seriam centros de alta complexidade, em oncologia, com quimioterapia ambulatorial, para pacientes com Câncer, Leucemias, Linfomas e / ou Mielomas. Estão, às vezes, acopladas a algum Hospital de grande (ou médio) porte, juntamente com cirurgia, radioterapia e mesmo internação hospitalar ai seria UNACON. Não sofrem, em geral, auditoria pelas secretarias de saúde (Municipal ou Estadual), ou mesmo, sem nenhum controle social de seus tratamentos ou faturamentos.

    Fonte:http://www.sinmedrj.org.br/informativos/index.php?set=TROMBONE&id=386&set=TROMBONE

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  5. "A Portaria do Ministério da Saúde n° 741 determina a distribuição dos CACON e UNACON de acordo com a população de cada região – Um CACON para cada 4 milhões de habitantes. O Piauí, que possui pouco mais de 3 milhões, credenciou como centro o Hospital São Marcos. Todo paciente com diagnóstico comprovado de câncer deve obrigatoriamente ser encaminhado a este hospital, que tomará a responsabilidade pelo tratamento oncológico." (http://teresinadiario.com/noticias/teresina-e-referencia-na-luta-contra-o-cancer/) Hoje, devido a mudanças no estilo de vida e na expectativa de vida, percebe-se que os casos de câncer aumentaram, logo, surge o seguinte questionamento, será que um CACON para 4 milhões de habitantes é um número ideal?

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  6. UNACON - Hospital que possui todas as condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento dos cânceres mais prevalentes no Brasil (cirurgia geral/coloproctologia, ginecologia/mastologia e urologia).
    . Caso a UNACON não ofereça assistência para o tratamento radioterápico na própria Unidade, deverá ser estabelecida referência formal para o encaminhamento dos doentes que necessitarem desse procedimento.

    CACON - Hospital que possui todas as condições técnicas, instalações físicas, equipamentos e recursos humanos adequados à prestação de assistência especializada de alta complexidade para o diagnóstico definitivo e tratamento de todos os tipos de câncer.
    . Todo CACON oferece tratamento assistencial radioterápico na própria estrutura hospitalar.

    QT - Serviço Isolado de Quimioterapia

    . São clínicas isoladas que oferecem
    tratamento quimioterápico complementar às UNACON ou CACON.
    . Os pacientes encaminhados para estes Serviços devem estar vinculados, de acordo com a rede planejada pelo Gestor, a uma Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia ou CACON, para cooperação técnica e planejamento terapêutico global conjunto dos casos.

    RT - Serviço Isolado de Radioterapia

    . São clínicas isoladas que oferecem tratamento quimioterápico complementar às UNACON ou CACON.
    . Os pacientes encaminhados para estes Serviços devem estar vinculados, de acordo com a rede planejada pelo Gestor, a uma Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia ou CACON, para cooperação técnica e planejamento terapêutico global conjunto dos casos.


    http://bvsms.saude.gov.br/bvs/dicas/133cancer_sus.html

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